Uma Ferida no Jardim

Todos nós gostamos de visitar, passear e descansar no jardim. Existe um grande jardim nascido do Coração de Deus. Foi Ele o Santo jardineiro quem plantou o jardim do Éden. Ele cuidou de tudo, todos os detalhes foram bem pensados e amados. No meio do jardim ele pôs uma grande preciosidade: o homem e a mulher criados à sua imagem e semelhança. Tudo era belo e “Deus viu que tudo era muito bom“ (Gn 1,31). Essa beleza criada gerou poemas que enchem de alegria a vida. O Cântico das Criaturas de São Francisco testemunha esse gênero literário permeado pela fé. Cada um de nós, seres humanos, o campo, a cidade, os animais, a vegetação, o ar e as águas fomos criados para ser, com a nossa vida, um verdadeiro “louvor das criaturas” ao bom Deus. 

Lamentavelmente existe uma má inclinação, característica própria do Tentador, que entranhou-se na alma humana. E uma ferida foi aberta na criação. O jardim estava ferido. Essa má inclinação levou ao desordenamento da vida pessoal, familiar e comunitária. Mas não parou por aí, pois o próprio jardim começou a ser explorado e maltratado. Tudo parecia muito sutil e por isso gastou longo tempo para se perceber que aquele mal destruidor estava presente e o jardim era tomado por uma grande metástase. Seus gemidos e gritos já vêm sendo ouvidos há muito tempo. E sabemos que não existe “planeta reserva”. Só temos este! E, embora ele viva sem nós, nós não vivemos sem ele.

Nos últimos tempos, a Igreja fez ecoar o plano de Deus, que olha para o que Ele criou e que era muito bom, mas atualmente está sendo descuidado. Por isso o grande grito agora é para que se cuide da “casa comum” e da vida que nela habita, isto é: praticar a “ecologia integral”. Não há como pensar essa dimensão sem pensar na vida, na natureza que a envolve e lhe dá sustento. Não há também como cuidar da natureza sem pensar no Criador que deseja santificação e salvação da obra criada. Quando se pensa em ecologia integral, une-se toda a Terra ao céu. Tudo está interligado como nos disse o Papa Francisco na sua encíclica Laudato Si.

A ferida tem se tornado cada dia maior, gerando uma crise socioambiental. Parece um verdadeiro colapso planetário. Já estamos experimentando seu prenúncio nas grandes catástrofes que assolam o nosso país. A exploração do meio ambiente é muito grande e poucos se beneficiam do resultado. A natureza e a vida que nela habita está sendo dia por dia intoxicada e envenenada. Os impactos negativos diante das mudanças climáticas têm dado sinais de que é preciso fazer algo. Os pequenos vão sendo educados dia por dia para cuidarem melhor da casa comum, mas os poderosos, aqueles que têm nas mãos a chave do crescimento industrial e da exploração do meio ambiente, não estão minimamente preocupados com essa crescente ferida.

É verdade que em alguns ambientes já houve avanços, conscientização e busca de um desenvolvimento sustentável sem degradar o meio ambiente. Mas vale dizer que as cicatrizes da ferida ainda estão aí bem visíveis e é preciso fazer algo para que elas não avancem.

Com a Campanha da Fraternidade trazendo o tema da Ecologia Integral, a Igreja quer chamar a responsabilidade para se ter um intenso cuidado do resto do jardim que ainda existe. Quando o jardim não mais existir, a vida também não existirá… a não ser que haja uma conversão também integral.

Dom Messias dos Reis Silveira

Bispo de Teófilo Otoni-MG