A luz da Palavra

Palavra de Deus 2

FESTA DO BATISMO DO SENHOR

12 de janeiro de 2025

Leituras:  Is 42,1-4.6-7 // At 10,34-38 // Lc 3,15-16.21-22

O Filho Amado, em oração, assume a sua missão

 

O Natal se prolonga nas festas da Epifania e do Batismo de Jesus, que têm em comum a ideia da manifestação de Deus ao mundo em Jesus de Nazaré. Deus se manifestou ao próprio Jesus para lhe confiar sua missão. O sentido principal da festa de hoje é a investidura de Jesus como Messias. A 1ª Leitura encaminha-nos para a compreensão do Evangelho, apresentando a eleição de um misterioso, dócil e misericordioso personagem para levar aos povos e aos continentes o verdadeiro conhecimento do Deus de misericórdia e fidelidade. É o “Servo de Deus” (= ministro, encarregado). Na sua disposição a executar o projeto de Deus, o “servo” prefigura Jesus. A 2ª Leitura registra o 1º anúncio (“querigma”) proclamado por Pedro aos pagãos: Jesus é Messias e Filho de Deus, “ungido” com o Espírito Santo para exercer sua missão messiânica, a partir de seu batismo por João.

O Evangelho mostra a “investidura” de Jesus para sua atividade pública, que começa com a proclamação da chegada do Reino de Deus. “Depois de mim vem aquele que é mais forte do que eu. Eu nem sou digno de, abaixando-me, desatar a correia de suas sandálias” (tarefa do escravo ou do discípulo a serviço de seu “mestre”). Enquanto João batiza com água, o “mais forte” chega para batizar com Espírito Santo, isto é, mergulhar todos e transformá-los no “Amor” de Deus. Para Lucas, João Batista é a última testemunha de um tempo salvífico que está chegando ao fim: o tempo da antiga Aliança. O aparecimento em cena de Jesus significa o começo de um novo tempo, o tempo em que o próprio Deus vem ao mundo, feito pessoa humana, para oferecer à humanidade escravizada a vida e a salvação. No episódio do “batismo” revela-se, desde logo, a missão específica e a verdadeira identidade de Jesus. O curioso é que neste relato, o batismo de Jesus se caracteriza pela menção da oração. É na oração que Jesus procura a vontade do Pai.

É durante a oração que Jesus vê o céu se abrir, isto é, unir-se à terra. Desta forma, Lucas anuncia que a atividade de Jesus vai reconciliar o céu e a terra, vai refazer a comunhão entre Deus e os homens que o pecado rompera. É também durante a oração que Jesus vê, representado em forma de pomba, o Espírito do Pai que, no início da criação pairava sobre as águas. Lucas quer assim evocar a nova criação que terá lugar a partir da atividade que Jesus vai iniciar. A missão de Jesus é, portanto, fazer aparecer um Homem Novo, animado pelo Espírito de Deus. E é ainda, na força da oração de Jesus, que todos podem ouvir a “voz do céu”, que representa sempre a opinião de Deus acerca de uma pessoa ou de um acontecimento. Essa voz declara que Jesus é o Filho de Deus. A referência ao Servo do Senhor (da 1ª Leitura) sugere que a missão de Jesus, o Filho Amado de Deus, não se desenrolará no triunfalismo, mas na obediência total ao Pai; não se cumprirá com poder e prepotência, mas na suavidade, na simplicidade, no respeito pelos e por todos os homens.

Podemos ver no fato de Jesus receber sua missão na oração um exemplo para nossa vida. Recebemos nossa missão de Deus no encontro com ele no silêncio, imersos no mistério da vida divina e não por puras razões humanas. Observe-se ainda que, embora contemplando Deus, Jesus não está separado do povo, mas participa com todo o povo no movimento que surgiu em tomo do Batista. Cristo é o protótipo do fiel na Igreja e na humanidade. Assim seja o cristão: participando com seus irmãos na comunidade do batismo, esteja em contínua união com o Pai e assuma sua missão para a salvação de todos, no exercício da absoluta e universal misericórdia.


CAMPANHA DA FRATERNIDADE 2024

O tema da CF 2024, “A Fraternidade e a Amizade Social”, tem por lema: “Vós sois todos irmãos e irmãs” (MT 23,8). Considerando as situações existenciais, sociais, políticas, econômicas e estruturais do Brasil, com suas regiões e multifaces eclesiais tão diversas, com marcas de polarizações religiosas, políticas, geográficas e culturais, a Igreja, como Mãe e Mestra, vem trazer uma proposta, à luz da “Alegria do Evangelho”, de conversão ao Outro, como imagem amada e querida pelo Criador, a fim de que a “Fraternidade Universal” seja sonhada, desejada, buscada e testemunhada por todos os homens e mulheres de boa vontade.

O objetivo da Campanha é “despertar para o valor e a beleza da fraternidade humana, promovendo e fortalecendo os vínculos da amizade social, para que, em Jesus Cristo, a paz seja realidade entre todas as pessoas e povos”. A partir desta perspectiva geral, são propostas várias finalidades específicas, com o olhar voltado aos desafios reais que nos interpelam enquanto ‘seres sociais’, chamados à amizade social. Há uma proposta de civilização, que gere a cultura da paz entre os povos, nas relações humanas e no mundo, já que, existem ‘guerras em pedaços’ em tantos lugares e periferias geográficas e existenciais. A Campanha deste ano traz consigo “o convite a um amor que ultrapassa as barreiras da geografia e do espaço, nos interpela à comunhão e solidariedade, mostrando que a conversão passa pela experiência da humildade, da aceitação do outro e da alegria do encontro que vem da ressurreição. A proposta da fraternidade para o cristianismo tem o amor Ágape na sua base, cuja fonte é o amor de Deus. A temática abordada é uma proposta de humanismo solidário e de realização da existência humana. Não é o ódio que leva o ser humano à felicidade; mas é no amor que a sua vida ganha sentido e plenitude. Num mundo marcado por tantos sinais de violências, simbólicas, físicas e digitais, a chamada de atenção que a Igreja promove é uma ação necessária, que está em consonância com a sua missão de ‘perita em humanidade’ (Paulo VI).

A fraternidade e a amizade social, neste momento crítico da história, em que há um pipocar de conflitos mundiais, como frequentemente denuncia o Papa Francisco, passa a ser um ‘projeto civilizatório’. A humanidade padece de paz. Em muitos recantos do globo há nações que vivem em estado de beligerância. O lucro com a venda de armas é uma questão ética, que nos diz muito sobre a preponderância do poder econômico sobre a dignidade da pessoa humana. Essa, por sinal, desde os ultrajes da segunda guerra mundial, tem sido cada vez mais violentada, tendo como objetos os seres humanos em situação de vulnerabilidade. Cabe destacar o fomento da cultura do descarte, que coloca os idosos e embriões concebidos em situação de cancelamento e abandono. O patrocínio dos países sempre mais ricos à custa da promoção da colonização ideológica e política de outras nações é algo que clama aos céus.

A Doutrina Social da Igreja, com seus princípios basilares, dentre eles o da subsidiariedade, conclama para que haja, ao invés do usufruto parasitário, o apoio das potências econômicas e militares, com logística e educação, aos países mais pobres. Sempre atenta aos sinais dos tempos, com os desafios culturais e estruturais para a consecução da paz, ela atualiza a sua proposta de promoção da amizade social. Com esse intento, ela torna audível que é fundamental que a política contemporânea retome essa base de sustentação das relações humanas e entre os povos. Essa é a “melhor política”. Assim como a igualdade e a solidariedade, que nas construções das narrativas liberais foram mais desenvolvidas, a temática da fraternidade também precisa ser levada a bom termo e consecução.

No cristianismo, o tema da fraternidade entre todos os que são criados à imagem e semelhança de Deus é uma norma fundante. Quem é de Deus, ama o semelhante. Os ensinamentos de como ‘ser cristão’ são sintetizados evangelicamente por Jesus Cristo no seu “Sermão da Montanha“. Matar em nome da religião, ou pior, promover a guerra e a destruição do Outro em nome de Deus é contraditório com a proposta da fé cristã. No Brasil, a manipulação política e ideológica do imperativo religioso tem sido constantemente assumida por lideranças que usam a boa fé de milhões de cidadãos para o acirramento do ódio e o incitamento do caos psicológico e social.

A Campanha da Fraternidade é uma bússola para que muitas luzes sejam postas nos caminhos de todas as camadas sociais do nosso país. Com sua capilaridade, a Igreja se propõe a ser missionária da justiça e da paz neste contexto de polarizações e desmandos relacionais.